Não pretendo com este artigo apresentar soluções, que já foram alvo de publicação no livro "Reinventar Portugal", mas tão só reflectir sobre as causas que estão por detrás desse afastamento.
No nosso país, a opressão desenvolvida durante o período do Estado Novo, limitava a defesa e divulgação de ideais. Portugal vivia num sistema de partido único ou liderante, em regime ditatorial, com todas as consequências resultantes desse sistema.
Importa aqui, para maior compreensão dos motivos que nos levaram ao afastamento dos Partidos Políticos, fazer uma breve referência à evolução histórica destes:
Os Partidos tal como se entendem hoje, são uma invenção relativamente recente, pois só no Século XIX a origem dos mesmos deixou de ser eleitoral ou parlamentar, para passar a ser exterior, com a criação dos Partidos de Quadros ou Notáveis. Este tipo de Partidos procurava angariar para o seu seio as figuras mais notáveis de determinada sociedade, a fim de transmitir à sociedade a imagem de que tinham os melhores elementos para a resolução do problemas da sociedade. Não interessava muito a ideologia, mas sim a imagem e o reconhecimento social, de uma sociedade esmagadoramente inculta e iletrada. O importante, afinal, era ganhar as eleições e eleger o maior número possível de membros para os cargos políticos...
Já no Século XX, com o crescer dos ideais, surgem os primeiros Partidos de massas ou militantes. Os eleitores deixavam de votar num determinado Partido por ter os melhores quadros, para passar a votar naquele que concretiza politicamente o seu ideal. Desenvolvem-se os Partidos Comunistas, Socialista, Social-Democratas, Liberais, Conservadores... Os Partidos nasciam em torno de um ideal que atraía os eleitores, que se fidelizavam e militavam, comprometendo-se os lideres politicos a colocar em marcha as ideias e projectos elementares para o cumprimento do ideal e os eleitores a apoiar a concretização dessas ideias e projectos e a votar no Partido.
Quando se deu o 25 de Abril em Portugal e o país deixou de viver num sistema de Partido único ou liderante, era esta organização político-partidária que mais estava presente nos Estados da Europa. Assim, depressa Álvaro Cunhal avança com a legalização do Partido Comunista Português, apoiado no ideal comunista marxista-leninista, comum a muitos outros pequenos Partidos de Esquerda; Mário Soares legaliza o Partido Socialista, baseado no ideal do socialismo; Francisco Sá Carneiro funda o PPD/PSD de ideal Social Democrata; Freitas do Amaral funda o CDS, de ideal social cristão.
Nas primeiras eleições livres e democráticas as pessoas podiam escolher um ideal e tinham quase a certeza de que aqueles em quem votavam tudo fariam para defender o rumo assumido perante os militantes e por estes defendido.
Nos anos 80 e 90, Portugal começa a dar os primeiros sinais de alteração da sua base organizativa politico-partidária. Sociais-Democratas juntam-se a Centristas e a Monarquicos e formam a AD; os Comunistas juntam-se com os Ecologistas; surge um Governo-Central; nasce um Partido de notáveis apoiado na figura do Presidente da República Ramalho Eanes; um Partido ganha com maioria absoluta.
Estas coligações e acordos de conveniências começam a ser vistos pelos militantes e apoiantes idealistas como uma forma de traição; uma forma de manter o poder a qualquer custo.
Na Europa e um pouco por todo o mundo desenvolvido, os Partidos já tinham dado o salto para uma base de Partido de Eleitores ou Eleitorais de Massas, surgidos nos anos 60 do Século XX e caracterizados por uma redução da base ideológica, pouca importância do militante e abertura a grupos de interesses.
O objectivo dos Partidos passou a ser única e exclusivamente o da vitória eleitoral e da consequente governação. Não importa o projecto, ou o ideal, ou o programa; a única coisa realmente importante é ganhar as eleições e governar.
No entanto, na minha opinião, a política andou depressa demais em relação à população e as consequências são cada vez mais visiveis e indesejadas.
A traição governativa em relação à própria base de sustentação ideológica desmotiva e irrita a militância. É impossível a um Socialista de ideal, em consciência, apoiar o actual Governo de José Sócratas, como já antes tinha sido difícil a qualquer Social-Democrata apoiar o Governo de Durão Barroso. É certo que a conjuntura actual obriga a mudanças rápidas e o poder de decisão está limitado, mas a postura de arrogância e desprezo que os governantes e lideres partidários demonstram em relação às suas bases eleitorais é tão grande como aquela que um sistema de partido único tem relativamente à população em geral.
Não vou cair no exagero de dizer que vivemos numa ditadura, mas é evidente que já deixamos de viver num sistema de Partido de Militantes, por culpa exclusiva dos próprios Partidos, cujas direcções entre a escolha do cumprimento do ideal ou da governação, escolhem a última.
Isto mesmo já alguns militantes idealistas de quase todos os Partidos já perceberam. De que outra forma poderia Manuel Alegre e outros Socialistas de ideal ir contra as vontades da maioria do seu próprio Partido? De que outra forma poderiam os opositores aos líderes do PSD declará-lo abertamente? Tudo o que interessa aos grupos de quase oligarcas que se apoderaram das lideranças dos maiores Partidos portugueses é a conquista do poder e a sua manutenção a qualquer custo.
A implementação de um sistema de Partido de Eleitores ou Eleitoral de Massas, tem um problema grave para a dignidade e transparência política. A ausência da concretização ou implementação de um permite a que qualquer um seja militante de qualquer Partido e que transite entre Partidos a qualquer momento, sem necessitar de outra explicação que não a de que "este é que está a dar!". É quase como os Clubes de Futebol, onde os jogadores fazem transferências milionárias e onde não há nenhuma razão especial para se ser de um ou de outro, para além da questão sentimental. O problema é que no futebol as transferências são públicas e conhecem-se as compensações, na Política não...
Se o PS tem um grave problema a resolver entre os militantes idealistas e os militantes "de massas", que pode originar uma ruptura com consequências imprevisíveis no sistema político português, também o PSD tem um grave problema de liderança, pois é evidente que poucos são os militantes idealistas que apoiam a postura, as políticas, as ideias, os projectos e a imagem da líder do Partido.
Esperamos que ambos os Partidos resolvam os seus problemas internos rápidamente, sob pena de criarem um maior afastamento entre eleitos e eleitores, entre líderes e militantes, entre governantes e governados, que só beneficiará os poucos Partidos que ainda têm na sua base uma forte componente ideológica, mas que podem ser perigosos, na medida em que são os que defendem os ideais mais extremistas, sejam eles de direita ou de esquerda.
Para bem de Portugal é importante que se resolva o problema actual dos Partidos no nosso país, na minha opinião com a criação de um novo Partido de Militantes de base ideológica socialista por Manuel Alegre e com a demissão imediata de Manuela Ferreira Leite e a eleição de um líder que defenda o ideal Social Democrata e a sua militancia ideológica.
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